segunda-feira, 1 de novembro de 2010

El Cazador - Una Noche Salvaje

               Jane acordou com o som da porta de seu quarto sendo aberta, se virou a tempo de ver seu marido, Richard, saindo do quarto. - Desculpa, amor, eu não queria acordá-la. - Disse ele. - Prometo que amanhã eu boto um óleo nessa dobradiça.
               - Tudo bem, só me faz um favor: pega um copo de água aproveitando que você vai descer. – Respondeu Jane. – Ela se virou de bruços e colocou o rosto no travesseiro. Estava muito nervosa, já fazia quase uma semana desde que ela havia começado ouvir coisas. Tinha medo de que estivesse enlouquecendo. Por mais de uma vez havia perguntado ao marido se ele também havia escutado os ruídos que ela tinha ouvido. E a cada dia que passava os ruídos não só aumentavam sua freqüência como também pareciam estar mais próximos. Ouviu novamente a porta do quarto se abrir, uma coisa era certa: aquela dobradiça precisava mesmo de um óleo. – Nossa, você voltou rápido. – Ele sentou na cama. – Trouxe a minha água. – Perguntou enquanto também se sentava. Mas não havia ninguém ali. Jane entrou em pânico, seria aquela a prova definitiva de que estava ficando louca. – Rick?Rick?! – Chamou ela.
               Rick entrou correndo. – O que houve? Aconteceu alguma coisa? – Perguntou enquanto acendia a luminária.
               - Está tudo bem. – Disse Jane. – Eu só ouvi um barulho e fiquei com medo de que você tivesse caído da escada. Acho que eu devo ter cochilado.
               - Que susto que você me deu hein? – Disse Richard. - Você devia descansar mais, a mudança pra cá foi cansativa e você não parou de trabalhar desde que chegamos.
               Tá tudo bem, mamãe? – Ouviram uma voz de criança na porta. Tá sim, filho. – Disse Jane. Ela havia ficado tão assustada que esquecerá que Joshua estava dormindo no quarto ao lado.
               - Desculpa a mamãe é que eu tive um sonho ruim. Agora vamos todos voltar a dormir, que papai e mamãe tem que acordar cedo.

*** 
               Mais uma semana havia se passado e os problemas só se intensificavam. Jane agora já havia presenciado vultos, ouvido vozes e lamentos assustadores, e ela podia jurar que não se lembra de ter se arranhado ao contrario do que dizia a longa marca em seu braço. Já tinha pensado em ir a um medico, mas tinha medo de que estivesse realmente louca e fosse afastada de sua família. Eles tinham acabado de se mudar para a Louisiana, ela havia sido promovida e a empresa de seguros em que trabalhava havia dito que ela teria que ir para a capital, Baton Rouge. Richard aceitara na hora dizendo ser o melhor para a carreira dela e que ele poderia arranjar um novo emprego. Já havia um mês desde que eles se mudaram e ela ainda achava que estava louca, ela não podia se arriscar e deixar as coisas saírem do controle. Se ela estivesse maluca não queria arriscar a vida de seu filho de três anos. Então havia saído mais cedo do trabalho e fora procurar por ajuda profissional, porém o medico havia dito que não tinha percebido nenhum distúrbio, além de excesso de ansiedade. Disse que ela deveria se preocupar menos com esses barulhos e aparições e simplesmente ignorá-los, enquanto não passasse ela deveria ter consultas mensais e tomar um remédio leve, prescrito pelo doutor, para relaxar.
               Com tudo isso em mente Jane estacionava seu carro na garagem de casa, mas então reparou pelo retrovisor um homem encostado numa arvore. Ele vestia um sobretudo marrom escuro, um chapéu de mesma cor que cobria boa parte de seu rosto e uma calça jeans, as três peças estavam bem gastas. Era alto e de pele morena, tinha o físico de um atleta. Mas o que havia chamado à atenção de Jane era que ela olhava fixamente para sua casa. Quem seria aquele estranho que aparecera em hora tão pouco propicia? Ela saiu do carro e foi falar com ele. “Oras, onde já se viu ficar encarando uma casa de família como se pensasse em com invadi-la. Tinha que ter muita cara-de-pau mesmo” – Pensou. – Porém, quando o transito parou e teve a chance de atravessar, o homem não estava mais lá. “Será mais uma alucinação? Agora não poderei conversar com ninguém na rua sem duvidar de sua existência?” – E com esses pensamentos adentrou a casa.
               É claro que não havia discutido suas alucinações com seu marido, tinha muito medo de perdê-lo. Richard era um homem tão bom. Então resolvera manter segredo dele e manter sua rotina normal, ignorando os ruídos e vultos. Porém estes simplesmente aumentavam de intensidade, como se quisessem chamar a atenção dela. Fazia três dias desde a sua consulta e a situação só piorara. Estava pensativa lavando a louça quando sentiu uma imensa dor no ombro, descendo para as costas. Foi se olhar no espelho, e lá estavam cinco linhas vermelhas-sangue marcadas de seu ombro até o meio das costas. Saiu de casa correndo, aquilo não era normal. Procuraria outro medico, um que dissesse o que ela tinha, prefiria ser internada a deixar aquilo continuar. Porém ao sair de casa avistou o homem do sobretudo dormindo recostado na mesma arvore, do outro lado da rua. Ela precisava saber de uma vez por todas se ele também era fruto de sua mente. – Senhor? – chamou enquanto se aproximava. – Senhor?
               - Mierda! Me dormí di nuevo! – Disse ao acordado. - Gracias por despertarme, Señorita. – Porém quando viu quem o havia acordado tomou um susto.
              - É a segunda vez que eu pego você observando minha casa como se estivesse espionando. – Disse Jane. – O que o senhor quer?
              - Me desculpe, señora. Parece que eu tenho que melhorar minha discrição. A meu favor digo que estou acostumado a fazer isso de carro, porém tive um problema com lobos no caminho para cá e estou com o carro na oficina. – Disse o homem, agora em um Inglês perfeito. – Mas voltando a sua pergunta eu achei ter visto uma coisa estranha na sua janela e resolvi tentar confirmar minhas suspeitas. Contudo elas parecem estar erradas. Irei embora hoje mesmo já que lhe incomodo. – Se levantou e saiu andando rua acima como se nada tivesse acontecido.
               Jane ficou olhando abismada enquanto aquele misterioso homem ia embora. Então suas palavras ecoaram na mente dela “coisa estranha, o que ele quis dizer?” – Espera! Responda uma ultima pergunta! – Gritou, seguindo atrás dele. Estava arfando quando finalmente alcançou-o. – O que... Você quis dizer?... Com uma coisa estranha?
               Ele olhou-a de cima a baixo, como que se a analisa-se. – Porque a pergunta? Senhorita? – Ele agora apresentava um leve sorriso em seu rosto. – Por acaso você também se deparou com uma coisa estranha? – Jane olhou assustada para o homem. Para onde aquela conversa estava indo, seria possível que ela fosse real? – Olhe, senhorita, se não quiser falar eu não perderei meu tempo com você. – Disse rispidamente e já ia se virar quando ela disse:
               - Está bem, a verdade é que eu tenho visto e ouvido coisas dentro da casa. – Disse, não sem antes checar se havia mais alguém por perto. – Mas eu achei que estava enlouquecendo.
                - Bem, señora, para começar alucinações não fazem um machucado tão profundo como este que vejo em seu ombro. – O curativo que Jane havia colocado acabara de cair. – Eu acho que devíamos conversar sobre isso, mas não na sua casa. Você conhece algum lugar aqui perto onde possamos conversar em paz?
*** 
               Os dois estavam sentados em uma lanchonete que ficava na esquina, Jane já havia contado sua historia e o homem havia escutado em silêncio. – É isso, o que o senhor me diz? – Já fazia um tempo que o sorriso havia voltado ao seu rosto e ela estava preocupada que ele estivesse debochando dela. 
               - A señora me desculpe a excitação, mas eu estou feliz de saber que eu estava certo. Antes de contar-lhe qual o problema que enfrentas devo me apresentar: Yo soy Miguel, un cazador. O que eu caço é exatamente o tipo de criatura que ronda sua casa, um espírito. 
               Jane gargalhou. – Eu não sei quem esta pior, você por acreditar nessas coisas ou eu por dar papo para você. – Disse enquanto se levantava da mesa 
               Miguel também começou a rir. E antes que ela saísse da lanchonete disse: Eu não peço que confie em mim, señora, mas digo que devia fazê-lo para seu próprio bem e o de sua família. Depois desse ferimento as coisas só tendem a piorar. – Ele se virou e olhou para ela. – Me diga uma coisa, señora, o vulto que vistes era o de uma criança. – Ela foi embora sem dizer mais nada, mas ele não precisa de palavras o olhar dela já dizia tudo. Ele precisava se preparar, pois esta seria uma noite selvagem. Fazia muito tempo que ele não pegava um espírito maligno de verdade. Nos dias de hoje você só encontra espíritos brincalhões e poltergeists. Maus espíritos são mais difíceis de lidar. Se você for descoberto está perdido. 
*** 
               Jane estava deitada em sua cama quando novamente foi acordada com o barulho da porta. Olhou para o lado e seu marido ainda estava dormindo. Mas por cima do corpo do marido ela pode ver um homem na facha de seus 40 anos parado na porta. Ele colocou o dedo indicador na frente dos lábios e em seguida sumiu. Ela ia acordar o marido quando sentiu duas mãos frias sobre seu pescoço. Antes que ela pudesse fazer qualquer coisa o espírito estava sobre ela, sufocando-a. Ela não conseguia respirar, sua garganta doía muito. Ela devia ter acreditado em Miguel, agora morreria por causa de seu ceticismo. 
               De repente o fantasma afrouxou o aperto e logo em seguida saiu de cima dela, como se tivesse sido empurrado. Ela olhou em volta, a procura de Miguel, mas não havia ninguém no quarto. Ela se virou novamente e viu o espírito se debatendo contra a parede antes de sumir novamente, porém dessa vez ele não retornou e ela finalmente se deixou cair inconsciente sobre o travesseiro. 
               Alguns minutos antes: 
               Miguel saía de uma igreja e caminhava guardou o cantil que carregava em um dos bolsos do sobretudo. Com um terço em uma mão e um livro surrado na outra seguiu rezando pela rua, ao terminar disse: Señor, permitir que este pecador salve tres almas puras esta noche. – Ao adentrar a rua de Jane abriu o livro em uma pagina já marcada e antes de começar a recitar pensou “Tomara que só isso baste”. 

In nomine omnipotentis Dei, depellite 
daemones a me in servitute mea bona 
vallum contra eos. 
Malefici spiritus qui operatur malum sententia 
hominibus flagitiosis spiritus mendax deceperunt; 
Ludentes spiritus Credulitas Delectant te 
               
               Chegara à porta da casa e começou, sem parar o recital, a jogar a água do cantil nas paredes. 

eos vos odi omnis exercitus meus 
claudere anima tua consilia aures autem oro 
te misericordiam Dei. 

               Neste ponto havia terminado de benzer a casa. Estava prestes a entrar quando a porta se escancarou, arremessando-o para a rua. Ao se levantar voltou a ler, agora com mais alto, pois o vento estava muito forte. Avistou a porta o mesmo vulto que havia visto na janela – “Eu sabia nada pode enganar os olhos de um caçador treinado” – Ele caminhou em direção ao espírito, mas este continuava tentando, sem sucesso, afastá-lo, ele sabia que se Miguel chegasse a casa estaria tudo acabado. 

Ut alacritas custodiunt mihi digna, date 
resistere valet auctoritas spiritus malignos lumina 
Non necesse habeo ad occumbere cogitabant. 
Custodi me a superbiat, cor isentai 
invidia, odium, invidia, affectus omnes 
contra charitatem, quae tot ianuas 
Spiritus patens malum. 

               Agora ele estava bem perto, abriu o cantil novamente e esvaziou-o de uma só voz no fantasma. Este sumiu, como se fosse fumaça, com um grito aterrador. – Descanse em paz, espírito errante. – Disse o caçador. Agora estava tudo acabado. Felizmente aquele era um espírito novo, ainda não podia agir livremente. E aquela oração para afastar maus espíritos, apesar de fraca fora suficiente. 
*** 
                Miguel entrou na oficina, depois de vinte dias finalmente poderia reaver seu carro. – Opa, es una belleza! – Exclamou ao ver seu Mustang reluzindo em um canto da oficina. 
               - É, amigo, não foi nada fácil consertar ele. – Disse John, o dono da oficina. - Você tem certeza que foi um acidente com lobos? Eu acho que nem um urso conseguiria fazer aquilo com um carro. 
               - Bem, os lobos que eu caço, acho que pode–se dizer que não são do tipo normal. – E dizendo isso pagou pelo serviço e dirigiu cidade a fora. Havia escutado que era temporada de caça numa cidade do Texas, que fazia fronteira com a Louisiana, e queria chegar lá antes de outros caçadores. Aquele era uma caça muito especial.

Um comentário:

  1. ai esta o primeiro conto d'El Cazador, completo com um pouco de atrasso. até dezembro

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